terça-feira, 7 de julho de 2009

Brincadeiras da Vida III

No primeiro, eu falei das crianças e dos adultos. No segundo, só dos adultos. Neste, falarei só das crianças.
Algo me perturba há dias... mais especificamente na ultima sexta que eu estava em Curitiba.

Há uns 15 anos atrás, as crianças com cerca de 4 e 5 anos pulavam de felicidade ao ganhar um LP da Xuxa, se fantasiavam e tinham o microfone com "fru-frus" laranja, cópia perfeita ao da Xuxa no programa "Xow da Xuxa"... e as músicas da Xuxa eram relativamente inteligentes para crianças dessa idade: tinham conteúdo, tinham histórias, tinham ideologias, e claro, tinham ritmo (como em "Lambaxuxa", ou então a consagrada "Ilariê").


Passados 4 anos, novas crianças ainda ouviam Xuxa, cujas músicas já tinham mudado um pouco, temas um pouco mais românticos e músicas um pouco mais agitadas. Só que aqui já começou a existir a Era Sandy & Junior, músicas "romanticóides" cheias de "eu cresci agora sou mulher" ou então algo que fugia da inocência das crianças como "pra você me dar um beijo, você vai ter que rebolar..."

Aliás, o que realmente fugia da pura inocência de crianças de 5 e 6 anos era o "Tchan". Digo isso por experiência própria: minha irmã, nessa idade, ouvia Xuxa. Eu, com essa idade, ouvia Xuxa também , é claro, mas eu sabia todos os passos de "Segura o tchan, amarra o tchan, segura o tchan tchan tchan tchan tchan... depois de nove meses você tem o resultado..." - e isso lá era música pra uma criança ouvir???

Mas, como eu sempre digo, esse mundo consegue me surpreender. Estava eu no tubo esperando o biarticulado para ir à rodoviária, e lá tinha uma menina de 4 anos, 5 no máximo. Ela começou a cantar "a magia está no ar", erguendo as mãozinhas para cima... eu pensei, será que é uma nova música da Xuxa? Me enganei. Ela continuou "...sinto fogo na arena, o cavalo a celar, isso é coisa de cinema, uma beca invocada, um pingente no chapéu, ouço uma oração, sinto um pedaço do céu, alô galera de cowboy, alô galera de peão, quem gosta de rodeio bate forte com a mão!!"... Juro que pensei "esse mundo está perdido". Essa criança nem sabe o que significa "uma beca invocada", nem sabe a origem da palavra cowboy, e estava lá, cantando toda saltitante! Mas a culpa não é só dela, nem só dos pais!! Ora, a partir do momento que a saudosa Xuxa começou a cantar "5 patinhos foram passear..." com aquelas melodias de fazer neném dormir, o que as crianças, cheias de energia por causa das balas e chocolates, iriam preferir: dormir ou pular, mesmo sem saber o porquê da pulação?

Convenhamos, inocentes elas continuam sendo, é claro, mas cadê a liberdade de expressar essa inocência? Cadê os adultos que proclamam o amor, um "arco-íris de energia"? Quem se candidata a essa função??

12 comentários:

Laís Helena... disse...

Amora,vou descordar em parte,realmente as músicas que acabam caindo no público infantil ultimamente são um insulto à própria infancia,estes dias peguei meu irmão cantando "chora me liga,implora meu beijo de nooovo",eu quase deserdei ele...Mas xuxa,támbém,é pra matar muitos neorônios de desgosto,aquelas tentativas de inserir as crianças num contexto politicamente-correto são baixas,de colocá-las num mundo utópico,onde tudo é lindo,todos se amam,todos os sonhos são reais e blá blá blá,prá elas descobrirem por sí próprias que existe uma realidade lá fora,e levarem um baita de um tombo?!
Por isso meus filhos só ouvirão Bach,Mozart,Vivaldi!Huahuahuahuaau,quem vê pensa que alguém consegue controlar as informações que chegam aos filhos,ahh eu revolto!

Rê Menon. disse...

poois é, não temos como controlar...
mas acho que tirar das crianças esse mundo perfeito, cheio de sonhos e de esperanças é como dizer a elas: "olha, papai noel não existe, ou entao os ovos de páscoa nao vêm dos coelhinhos, mas do dinheiro do seu pai...
acho que temos que formar ciranças com esperança, porque se não o mundo realmente estará perdido: se nem elas terão, quem terá?!

Laís Helena... disse...

A esperança é a mãe da desilusão!Mas mesmo assim há uma diferença entre esperança e inocência,esperança na dose certa pode ser produtivo,estimulante,inocência e crença cega só nos dá a oportunidade de nos machucarmos,e mais tarde deixar terceiros nos machucarem!Imagina a criança vendo um mundo perfeito na tv,e olhando pela janela,vendo uma favela,a mãe alcolizada,o pai desconhecido a irmã prostituída(hauhuahauha nossa fui fundo agora,momento imaginação fértil),mas é mais ou menos por aí...É uma decepção!Por exemplo,Simpsons é um programa realmente educativo,lá sim,mostra a realidade da sociedade,com suas mazelas,onde todo mundo tem seus podres,e deve-se estar preparados pra parte feia do mundo!Assistindo os Simpsons os bacurís valorizarão o que tem dentro de casa!
ps:To adorando discussão social via blog!Huhauhauah...Resquícios da faculdade de História...

Rê Menon. disse...

Então conclui-se que a esperança é a mãe da inocência, e que, como não pode se ter inocência, a esperança deve ser infértil? (tudo bem, posso ter variado um pouco, mas é isso!) Não creio. Essa criança pode ter essa familia destruida, mas ver a esperança pela tv é como um catarse. Tudo bem, concordo que ela não pode viver presa nesse mundo de "paz e amor", é utopia demais, porém ela, como criança, precisa de certos "ideais" para ser alguém melhor que a mãe alcoolizada ou a irmã prostituta. Há um certo determinismo ao dizer que o meio no qual a criança vive a corrompe, mas se é assim, uma imagem de um meio (melhor do que o real) pode mudá-la também, de modo que ela possa mudar sua realidade. Quanto a oportunidade de quedas e machucados, isso compõe a realidade, isso faz a criança crescer. Não digo que devemos viver à base de decepções, mas que se não for assim, não estaremos vivendo.
P.S.: lembra da minha poesia, "Metamorfose"? "pq o amanhã só existe depois de abrir o casulo". Assim que ela deixar de ser uma larva comilona e dorminhoca, ela saberá o que é viver.

Rê Menon. disse...

Acabei de comparar uma criança a uma larva. Esse mundo está realmente perdido!

Entendam como uma metáfora, ok?!

Laís Helena... disse...

Não disse que ela é produto do meio,mas que ela deve ter consciência do meio em que está inseria,pra não dar passos maiores que as pernas...Claro que as decepções fazem parte do crescimento,mas nem todos tem estabilidade psicológica pra lidar com elas,algumas pessoas caem e desistem,outras ignoram e continuam cometendo os mesmos erros,baseados nos ideáis utópicos impostos pelos programas infantis em questão!Alguém que cresce ludibriado tem grandes chances de não conseguir aceitar a realidade...Por que esta,de uma forma ou outra é cruel!Os ideiais que vc mencionou,só podem ser alcançados com os pés no chão!Sabe,não é só depois de abrir o casulo que se começa a viver,Freud mesmo defende que uma grande porcentagem do que você é tem influencia de experiências adquiridas na infância!Há estudos que provam que certos acontecimentos intra-uterinos estão diretamente ligados à determinado traço de personalidade!Logo,a aceitação da realidade deve começar assim que possível,e na maioria das vezes o que ocorra não é uma catarse mas sim uma fuga,e convenhamos,fugir dos problemas,fugir da realidade é a pior forma de lidar situação!Quanto mais cedo você enfrenta o que te faz mal,ou te aflinge,mais cedo você passa por cima deste mal,e pode seguir sua vida...

Ps:Não,vc estava certa na sua comparação...O que são as crianças que não larvas de gente?

Rê Menon. disse...

Você não falou realmente nada de determinismo, concordo, eu o disse! hehehe...
Concordo com você, Freud explicou essa teoria e bem, quem sou eu para duvidar de Freud. Mas discordo quanto a "enfrentar os problemas o mais cedo possivel". Assim como existem aqueles que não conseguem aceitar a realidade, há também crianças que são realmente muito fracas para encará-las de fato muito cedo, talvez seja um peso enorme nas costas, e ela podem cair e nunca mais levantar. Quando digo das músicas infantis, é como eu já havia dito, hoje está tudo um caos, mas certas músicas de antigamente, por mais infantis que seriam, elas tinham algo de real nelas. "Índio não faz mais lutas/ Índio não faz guerra/ Índio já foi um dia/ O dono dessa terra/ Índio ficou sozinho/ Índio querer carinho/ Índio querer de volta a sua paz" - já prestou atenção no conteúdo escondido dessa música (é só um exemplo!)
Lhe darei dois exemplos verídicos: um menino nasceu sem pai (ele fugiu sem conhecer a criança). Sua mãe se casou com outro, e teve uma filha. Acontece que esse cara era alcoolatra, e batia na mulher e nas duas crianças. Hoje, ela conseguiu se separar. A menina vive em depressão e o menino, que aparentemente era uma criança feliz e sem problemas, começou a apresentar desvios de comportamento!! A mãe tem transtorno bipolar.

Adiantou a criança enfrentar o mundo assim tão cedo? Não. Adiantou a mãe ter uma infância feliz? Também não.
O que eu quero dizer é que músicas, desenhos, programas Não são a verdadeira solução para os problemas do mundo. Digo que eles PODEM ajudar. A realidade é dura, concordo, mas botar as crianças a tapa já é demais. O futuro a Deus pertençe, quem somos nós para adivinhá-lo como será?!

Laís Helena... disse...

Exatamente,tudo é muito relativo,cada situação é peculiar!Não injeção de otimismo ou de realismo que mude os acontecimentos por vir,mas sim a maneira de lidar!A criança da tua história enfrentaria a realidade de qualquer forma,a questão é que se esta criança vivesse num mundo de cristal,os acontecimentos seriam um golpe muito forte que destruiria este mundo em milhões de pedaçinhos(aposto que vc vai falar que pode-se consertar,mas sempre ficarão as marcas),já se ele tivesse a noção de que o mundo é construído à ferro e fogo,ele estaria preparado,com o pé atrás,e os acontecimentos abalaria o seu mundo sim,mas as estruturas permanesceriam...
É bem mais interna do que externa a questão...Crianças que cresceram com problemas podem sim,ser mais inocentes do que as que tiveram conforto,ou vice-e-versa,é relativo,como disse!Realmente,como você mencionou,não será o tipo de programa que a criança assiste que definirá totalmente o caráter dela,há coisas maiores,e inesplicáveis!
As mensagens das músicas da xuxa em sua mioria são muito boas,muito boas no sentido de benevolência mesmo!O risco é ser criada a ilusão de que a realidade reflete toda essa benevolência!Vamos dar um exemplo baixo e exagerado,mas será bem ilustrativo...Muitos índios foram massacrados pelo homem branco e hoje só querem paz!Mas outros utilizam-se das terras cedidas pelo ibama pra extração de madeira ilegal e outras coisas que vão contra os ideais e a pseudo-moral deles!É hipocrisia dizer "pelo menos faça sua parte,seja bom você",pois é necessária alguma malícia pra sobreviver no nosso formidável mundo cão!

Carlos Educarlos disse...

O importante não é a criança acreditar no Papai Noel, é saber que ele existe.

Rê Menon. disse...

HAHAHAHA, concordo com o Carlão...
mas é, a questão é muito mais interna, realmente vai além desse nosso debate em pleno blog!! HAHAHAHA...
mas é como nós confirmamos, tudo varia, tudo depende... Eu te garanto que essas duas crianças tiveram sim a oportunidade de ter uma infancia inocente, mas fora na mesma época que elas estavam submetidas ao padrasto... ficou dificil, porque é óbvio que elas viam aqueles desenhos fofinhos mas que suas realidades eram bem diferentes dos contos de fadas... Mas e quanto a mãe, que teve a sua verdadeira infância, mas que mesmo assim teve problemas? Agora há outras pessoas que tiveram uma infância nesse mundinho mas que depois conseguiram sobreviver. (talvez diria por experiência própria, poucas crianças aguentariam a quase perda do pai como eu, mas consegui isso graças as pessoas que estavam do meu lado). É como dissemos, tudo é muito relativo...

Laís Helena... disse...

Beem isso,relativo!Só sei que se um dia cometer a insanidade da procriação,vou evitar ao máximo o contato dos meus filhos com o que posse inebriar sua visão da realidade,me agradescerão depois!
Mas o carlão disse tudo!
Huahuahua qualquer besteira que professarmos aqui será em vão depois disso!
:D

Rê Menon. disse...

Só sei que se um dia eu cometer a insanidade da procriação... aiaiai, só você!
Não irei evitar, os deixarei livres para escolha, nada como o livre arbítrio desde cedo. Se eles quiserem a inocência ou uma uma "visão da realidade", o que importa é que eu estarei lá sempre que precisarem, se inocentes ao cairem em si, ou se chocados com a verdadeira realidade. Os pais servem para isso.
Quanto à "visão de realidade", você tem alguma de como seja? seus pais tem? eu tenho? Não, creio que não. creio que NINGUEM tem. Só sei q o Papai Noel existe. =)